Regulamentação de publicidade e propaganda médicas
Nos últimos anos, um número cada vez maior de profissionais de todas as áreas passou a identificar nas redes sociais um canal com enorme potencial de conexão com possíveis novos clientes, inaugurando uma verdadeira resolução no marketing digital.
Para conter os excessos que acompanham esse novo movimento e o conteúdo que se torna viral de forma rápida, incluindo vários posts patrocinados de profissionais de saúde, os órgãos de classe profissional passaram a editar normas para que os profissionais não cometam abusos e infrações éticas.
Com a medicina não foi diferente. Recentemente, o Conselho Federal de Medicina (“CFM”) editou a Resolução CFM nº 2.336/2023, que regulamenta a publicidade e propaganda médicas.
A nova Resolução, em seus 17 artigos, impõe limites, esclarece os direitos dos profissionais e clínicas – inclusive para captação de clientes – e indica quais são as obrigações éticas que devem ser respeitadas nas publicações.
A Resolução estabelece que o primeiro conceito, de publicidade médica, diz respeito ao ato de promover as clínicas e serviços e qualificações dos médicos. Já a propaganda médica é definida como a divulgação de assuntos e ações de interesse da medicina.
Para os efeitos dessa legislação, é importante esclarecer que são consideradas redes sociais próprias os sites, blogs, Facebook, Twitter, Instagram, YouTube, WhatsApp, Telegram, Sygnal, TikTok, LinkedIn, Threads e quaisquer outros meios similares que vierem a ser criados.
A Resolução indica que, em tais redes, o perfil do profissional e/ou clínica deverá conter, obrigatoriamente, o nome do profissional, com à menção expressa à “médico”, além número de registro no Conselho Regional de Medicina (“CRM”), e a especialidade e área de atuação seguida do número de Registro de Qualificação de Especialista (“RQE”).
Por sua vez, quando se tratar de divulgação de clínica e/ou hospital, o nome do estabelecimento e o número de cadastro no CRM deverão ser destacados, assim como o nome do Diretor Técnico-Médico e, igualmente, suas inscrições.
Nas redes sociais próprias do profissional, a publicidade e propaganda poderão ter o objetivo de formação, manutenção ou ampliação de clientela, bem como de transmitir conhecimento de informações médicas para a sociedade, mediante divulgação de novos procedimentos (validados pelo CFM e ANVISA), e de eventuais ofertas.
Nesse caso, o valor da consulta pode ser divulgado (por exemplo, uma consulta dermatológica tem um valor pré-definido que pode ser divulgado, inclusive em caso de promoção), mas o valor de procedimentos médicos recomendados em consulta (por exemplo, aplicação de toxina botulínica) não poderão seguir a mesma lógica, pois não correspondem à consulta e configurariam venda casada e/ou eventual premiação pela consulta médica, conforme ilustrado pelo próprio CFM.
O conteúdo da publicidade e propaganda deve ter como objetivo dar ciência à comunidade em geral das competências e qualificações dos médicos e dos ambientes, físicos ou virtuais, onde exercem sua profissão. É proibido o conteúdo sensacionalista, autopromocional, inverídico ou a prática de concorrência desleal.
O uso da imagem de pacientes ou de banco de imagens é autorizado também com finalidade educativa, voltada à elaboração de material direcionado à população a respeito de doenças e procedimentos em medicina e/ou relacionados à especialidade do profissional (RQE).
Na prática, é permitido aos profissionais a postagem de selfies, imagens e áudios, desde que não acompanhadas de textos indicando “o melhor”, “o principal”, pois característicos de concorrência desleal, conforme ilustrado pelo CFM:
Do mesmo modo, na hipótese de repostagem de conteúdo de terceiros/pacientes, tal ato será considerado ato do profissional, e está sujeito às mesmas restrições de concorrência desleal, conforme indica o CFM.
É importante deixar claro que as publicações e postagens de terceiros e/ou pacientes com elogios à técnica e ao resultado de procedimento, ainda que não compartilhadas em redes sociais do médico, serão investigadas pela CODAME quando ocorrerem de forma reiterada e/ou sistemática, ou seja, com o auxílio de robôs fake, visando coibir a prática de spam[2]
Para tal finalidade, as repostagens de terceiros deverão obedecer ao limite de no máximo 2 (duas) por semestre.
Ademais, são proibidos:
(i) propaganda sensacionalista (tal como “garantimos rejuvenescimento”, “doença sabidamente incurável tem cura”);
(ii) a divulgação de conteúdo científico inverídico ou não reconhecido pelo CFM e pela ANVISA;
(iii) a atribuição de capacidade privilegiada a aparelhagens (“milagreiro”);
(iv) divulgação de especialidade que não a do profissional divulgador;
(v) divulgar imagens e procedimentos transmitidos em tempo real;
(vi) oferecer serviços por meio de consórcios e similares;
(vii) permitir foco promocional ou propaganda patrocinada, tal como de marcas que divulguem o nome do profissional como “o melhor do ano”, “destaque da especialidade”;
(viii) divulgação expressa de marcas comerciais, de fabricantes de medicamentos, e produtos (fármacos, de higiene pessoal ou mesmo material esportivo) que possam induzir os pacientes à ideia de garantia de resultado;
(ix) propaganda ostensiva de produtos e insumos acima descritos nos consultórios médicos, tal como ilustrado pelo CFM.
É permitido o uso de imagens para informar sobre manifestações, sinais e sintomas que recomendem a procura de avaliação médica, assim como para a demonstração de resultados de técnicas e procedimentos, desde que autorizadas pelos pacientes, e desde que respeitem o anonimato, pudor e a privacidade do paciente que cedeu as imagens, em qualquer hipótese.
Nesse caso, podem ser utilizadas fotos comparativas de pacientes antes e após intervenção médica, desde que utilizadas imagens de ao menos 4 (quatro) pacientes distintos para demonstração dos possíveis resultados alcançáveis, sem utilização de photoshop ou semelhante, e que deverão ser acompanhadas de texto educativo contendo as indicações terapêuticas, possíveis resultados e dos riscos elencados em literatura científica, consoante indicação do CFM.
Importante ressaltar que é vedada a filmagem e divulgação de procedimentos médicos em andamento, à exceção de partos, cujas imagens pertencem exclusivamente à paciente.
Fora das redes sociais, a Resolução também regulamenta a relação dos profissionais com veículos e canais de comunicação em massa. Ao conceder entrevistas a qualquer veículo ou canal de comunicação, bem como ao publicar artigos e informações ao público leigo, o médico deve se portar como representante da medicina, devendo abster-se de condutas que visem angariar clientela ou pleitear exclusividade de métodos diagnósticos e terapêuticos.
Aos canais de comunicação em massa, é expressamente vedado ao médico a divulgação de endereço físico ou virtual, telefone e outros, exceto os dados pessoais do médico autorizados no art. 4º da Resolução: nome, número de registro no CRM e especialidade e/ou área de atuação, quando registrada no CRM, seguida pelo número de Registro de Qualificação de Especialidade (RQE).
Para responder às dúvidas dos profissionais quanto à publicidade e propaganda, para orientá-los e, igualmente, para apurar as infrações éticas ou penais, a Resolução instituiu que cada CRM possua uma Comissão de Divulgação de Assuntos Médicos (“CODAME”), bem como que o próprio CRM processe e julgue eventuais infrações éticas praticadas pelos médicos, pelos estabelecimentos de hospitalização e assistência médica, além dos entes sindicais.
Referida comissão tem função igualmente fiscalizatória, e será responsável por rastrear divulgações em qualquer mídia, inclusive na internet, para adotar as medidas pertinentes quando houver desobediência à Resolução, de modo que é relevantíssimo que a comunidade médica tenha conhecimento da Resolução, a obedeça e se utilize do CODAME para obter esclarecimentos sobre possíveis dúvidas para evitar a aplicação de possíveis penalidades.
Nesse sentido, em conduta preventiva à ação do CODAME e caso, necessário, após a instauração de fiscalização, a equipe do Menna.Barreto Advogados permanece à disposição para solucionar eventuais dúvidas e para auxílio em geral acerca das disposições da Resolução CFM nº 2.336/2023.
[1] https://www.flip3d.com.br/pub/cfm/index9/?numero=45&edicao=5578 > acesso em 28.11.2024.
[2] Spam é um termo comum da Internet que não só faz referência direta a e-mails indesejados, mas também a comportamentos em redes sociais para propagar notícias falsas e gerar tráfego para correntes. Além disso, eles servem como vetor para ataques tipo phishing ou mesmo golpes cada vez mais elaborados por estelionatários. Por dia, estima-se que mais de 100 bilhões de spams são enviados por e-mail. – fonte: https://www.techtudo.com.br/listas/2020/07/o-que-significa-spam-veja-como-evitar-no-e-mail-e-nas-redes-sociais.ghtml - acesso em 27.11.2024